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Terceirização: a precarização da proteção à mulher e à criança

A luta contra a terceirização não deve arrefecer, em face da aprovação da Lei 13.429. Trata-se de uma luta contra a intermediação da força de trabalho, que tem sido utilizada como subterfúgio para a subtração de direitos, dentre os quais está a vedação ao trabalho infantil.

A aprovação dessa lei, cujo projeto datado de 1998 foi desengavetado e aprovado às pressas, num claro golpe ao processo legislativo que se desenvolvia em torno do PLC 30, e como forma de impor algo claramente rejeitado pela sociedade, em todas as discussões e audiências públicas realizadas sobre o tema, apenas reacende a necessidade de falar abertamente sobre as consequências dessa opção social.

A terceirização é definida como uma técnica empresarial que promove o "enxugamento" da empresa, através do repasse de parte das atividades, para que possa haver maior dedicação à finalidade social do empreendimento. Outra daquelas mentiras que nos repetem todos os dias, mas que nem por isso se tornarão verdade. Basta ver a proposta contida no substitutivo ao PL 6787, que altera redação da recém aprovada Lei 13.429, para dispor que as empresas podem terceirizar qualquer atividade, todas as suas atividades. Ou seja, não se trata de especialização, trata-se de atravessamento, com o escopo exclusivo de redução de custos.

Segundo a pesquisadora Patricia Galvão, da Unicamp, terceirização tem raça e gênero: os serviços de limpeza e manutenção, por exemplo, mantém a maioria absoluta de mulheres negras como empregadas. Trata-se da reprodução de uma cultura que admitiu (e em certa medida ainda admite) a escravidão e que é pautada pela ideia de que as mulheres são mais aptas às tarefas domésticas.

Dados revelados por uma pesquisa do Sindicato das Empresas de Asseio e Conservação do Estado do Rio de Janeiro apontam que 92% dos trabalhadores nos serviços de limpeza terceirizados são mulheres, enquanto 62% são negros. Dados do Instituto de Pesquisa Econômicas Aplicadas apontam que, em 2009, existiam 7,2 milhões de brasileiros trabalhando na limpeza, cozinha e manutenção de casas e escritórios, dos quais 93% do total (cerca de 6 milhões) eram mulheres e 61,6% do total (4 milhões) eram negros e negras. A taxa de desemprego em 2009 era de 12% entre mulheres negras, comparada a 9% para mulheres brancas, 7% para os homens negros e 5% para homens brancos. De acordo com o o mesmo instituto, IPEA, em 2011 a taxa de escolarização de mulheres brancas era de 23,8%, enquanto entre mulheres negras era de apenas 9%.

Nesse mesmo ano, a renda média das mulheres negras era equivalente a 30,5% da renda percebida pelos homens brancos. Por fim, a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) de 2013, aponta que 70,6% das mulheres negras que trabalham nas regiões metropolitanas de Belo Horizonte, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Salvador, São Paulo e Distrito Federal estão nos setores de serviços, na sua enorme maioria já como terceirizadas. Nos serviços de telemarketing a escolha de mulheres, negros e negras, para o trabalho, é por vezes justificada pela invisibilidade que esse trabalho promove. Longe dos olhos do consumidor, a atendente não precisa preencher o requisito perverso e racista da “boa aparência”.

E não é só isso. A terceirização também tem sua predileção por crianças. No último Relatório Mundial sobre o Trabalho Infantil, publicado pela OIT, há referência à direta ligação entre pobreza e trabalho infantil. A precarização das condições de vida e dos vínculos de trabalho é determinante, portanto, para impedir que a retórica de proteção se torne realidade. Em um país sem garantia de emprego, como o Brasil, no qual (de acordo com pesquisas oficiais) cerca de doze milhões de pessoas trabalham em empregos precários, como terceirizados, é evidente o estímulo à exploração de crianças e adolescentes.