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Afastamento de gestantes e lactantes do local de trabalho

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Por: Samara Ferrazza Antonini, Silvio Eduardo Fontana Boff e Saulo Oliveira do Nascimento

Tem-se falado bastante a respeito da Lei nº 14.311/2022, recentemente publicada, que trata do retorno ao trabalho das gestantes. Como pode haver confusão sobre a matéria, o Escritório Paese, Ferreira & Advogados Associados presta os esclarecimentos abaixo sobre o afastamento de gestantes e lactantes de atividades insalubres e o afastamento decorrente da pandemia ocasionada pela COVID-19.

De início, cabe destacar que existem duas situações distintas, as quais decorrem de leis diferentes.

Nesta linha, ainda no ano de 2016, foi sancionada a Lei n. 13.278/16, que acresceu a? CLT o artigo 394-A, determinando o afastamento de gestantes e lactantes das atividades insalubres, mantendo-se a garantia do pagamento do adicional, podendo as empregadas ser deslocadas para outro local, desde que este seja salubre, ou, na impossibilidade disto, ser afastadas com a percepção do salário-maternidade equiparado a gravidez de risco. O mencionado artigo de Lei está assim redigido:

“Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:
I - atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação;

II - atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, durante a gestação;
III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau, durante a lactação.

§ 1o (VETADO)
§ 2o Cabe à empresa pagar o adicional de insalubridade à gestante ou à lactante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, por ocasião do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço.
§ 3o Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento.”

Por sua vez, a reforma trabalhista implementada em novembro de 2017 teve como um dos objetivos afastar a proteção da mulher gestante e lactante em relação a atividades insalubres, garantida pelo artigo acima, condicionando este afastamento à apresentação de atestado específico de saúde.

Contudo, o Supremo Tribunal Federal, em 29-05-2019, julgando a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5938, decidiu pela inconstitucionalidade desta alteração, que exigia a apresentação de atestado médico, por entender que a proteção à maternidade e ao nascituro são direitos irrenunciáveis, mantendo o texto original, até hoje vigente.

Importante destacar que esta lei somente atingiu as trabalhadoras que laboram em atividade insalubre.

Já em 2021, no período da pandemia, foi publicada a Lei 14.151/21, a qual assegurava a todas as empregadas gestantes (lactantes não foram beneficiadas por esta Lei), independentemente de trabalharem em local insalubre ou salubre, o afastamento das atividades presenciais enquanto perdurasse a emergência de saúde pública decorrente do novo Coronavírus, permanecendo a empregada à disposição do empregador para trabalho à distância, nos seguintes termos:

Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

Assim, conforme infere-se, temos duas leis determinando o afastamento das empregadas mencionadas. A primeira afastando gestantes e lactantes apenas quando do labor insalubre (Art. 394-A da CLT) e a segunda afastando as gestantes de todas as atividades, em decorrência da pandemia (Lei 14.151/21).

Agora, em 9 de março de 2022, o Presidente da República publicou a Lei 14.311/2022, alterando Lei 14.151/21, garantido o afastamento apenas às gestantes não vacinadas, determinando o retorno destas ao trabalho em três situações: 1) quando do encerramento do estado de emergência; 2) após a vacinação ou; 3) mediante opção individual. Vejamos:

Art. 1º Esta Lei altera a Lei no 14.151, de 12 de maio de 2021, para disciplinar o afastamento da empregada gestante, inclusive a doméstica, não imunizada contra o coronavírus SARS-Cov-2 das atividades de trabalho presencial quando a atividade laboral por ela exercida for incompatível com a sua realização em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.

Art. 2º O art. 1º da Lei no 14.151, de 12 de maio de 2021, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial.

§ 1º A empregada gestante afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, sem prejuízo de sua remuneração.

§ 2º Para o fim de compatibilizar as atividades desenvolvidas pela empregada gestante na forma do § 1o deste artigo, o empregador poderá, respeitadas as competências para o desempenho do trabalho e as condições pessoais da gestante para o seu exercício, alterar as funções por ela exercidas, sem prejuízo de sua remuneração integral e assegurada a retomada da função anteriormente exercida, quando retornar ao trabalho presencial.

§ 3º Salvo se o empregador optar por manter o exercício das suas atividades nos termos do § 1o deste artigo, a empregada gestante deverá retornar à atividade presencial nas seguintes hipóteses:

I - após o encerramento do estado de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2;

II - após sua vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2, a partir do dia em que o Ministério da Saúde considerar completa a imunização;

III - mediante o exercício de legítima opção individual pela não vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2 que lhe tiver sido disponibilizada, conforme o calendário divulgado pela autoridade de saúde e mediante o termo de responsabilidade de que trata o § 6º deste artigo;

IV - (VETADO). § 4º (VETADO). § 5º (VETADO).

§ 6º Na hipótese de que trata o inciso III do § 3º deste artigo, a empregada gestante deverá assinar termo de responsabilidade e de livre consentimento para exercício do trabalho presencial, comprometendo-se a cumprir todas as medidas preventivas adotadas pelo empregador.

§ 7º O exercício da opção a que se refere o inciso III do § 3º deste artigo é uma expressão do direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, e não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação qualquer restrição de direitos em razão dela." (NR)

Art. 3º (VETADO). Art. 4º

Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

Todavia, embora parcialmente revogado o afastamento de gestantes em decorrência da pandemia da Covid-19, conforme as previsões constantes da Lei 14.331/22, permanece em vigor o artigo 394-A da CLT, que assegura o afastamento das gestantes e lactantes das atividades insalubres, muito comum nos hospitais e clínicas, lembrando-se que o STF já decidiu pela sua constitucionalidade e validade.

 

Samara Ferrazza Antonini, Silvio Eduardo Fontana Boff e Saulo Oliveira do Nascimento são advogados e atuam na área do Direito Trabalhista e Sindical.