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Excesso de trabalho pode causar doenças cardíacas, acidentes vasculares cerebrais e doenças psiquiátricas

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Por: Dayana Pessota Leite

Em 2021, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) [1] publicaram um estudo inédito realizado ao longo de 16 anos, que estima que em 2016, cerca de 745 mil pessoas morreram vítimas de algum tipo de acidente vascular cerebral ou doença cardíaca, relacionados a longas jornadas de trabalho cumpridas ao longo da vida profissional.

Essa análise global constatou que trabalhar em jornadas de 55 horas amplia ainda mais esse risco, em comparação com jornadas de até 40 horas semanais. As estatísticas mostram que as mortes são mais prevalentes em homens e muitas vezes ocorrem não necessariamente no período em que estão trabalhando de forma intensa, mas nas décadas seguintes, quando já não expostos a tais condições profissionais.

É fato científico incontestável que essas moléstias estão ligadas a histórico familiar, são “facilitadas” quando a pessoa apresenta hipertensão, obesidade, estilo de vida pouco saudável, como sedentarismo ou alimentação inadequada, mas o excesso de trabalho pode ser fator decisivo para surgimento de tais problemas, muitas vezes fatais.

Para além da sobrecarga de jornada, atividades que envolvam elevada responsabilidade e tensão, ritmo de trabalho penoso (comum em profissionais da área da saúde), assim como trabalhos com grande nível de cobrança, exigência de metas de produtividade muito altas e variáveis (uma constante em empregados que atuam em bancos, comércio e indústria), são também condições propícias para desencadeamento de casos de stress, depressão, síndrome de Burnout [2], problemas de ordem neurológica entre outros diagnósticos semelhantes e estes, inclusive, também podem levar a problemas cardiovasculares no futuro.

Diferentemente do que ocorre em outros países, não há informações de que o Ministério da Saúde tenha investigado ou, pelo menos, divulgado estatísticas ou tenha intenção de elaborar estudos epidemiológicos sobre os riscos dessas doenças crônicas e sua relação com determinadas atividades profissionais, o que é bastante preocupante, especialmente num momento de pandemia mundial que se prolonga há bem mais de um ano, em que não só há contaminações massivas de toda a população pela COVID-19, como explodiram os casos – especialmente em profissionais de saúde – de doenças psiquiátricas, relacionadas a ritmo intenso e penoso de trabalho imposto pelos hospitais para atendimento de pacientes.

Não fosse suficiente, diversos outros segmentos profissionais tiveram que reduzir o número de empregados e, em contrapartida, foi imposto a estes acúmulo de trabalho para suprir as vagas dos demitidos, muitas vezes com redução de salário e insegurança persistente, assim como milhares migraram para o teletrabalho, muitos sem qualquer estrutura ou preparação prévia, um formato onde esfera privada e profissional se confundem muito e pode elevar significativamente o número de horas trabalhadas  e os níveis de stress.

Somando-se à precarização do trabalho, bem como a redução significativa da fiscalização das condições ambientais das empresas e instituições pelos órgãos competentes, a medicina no país é reativa, ou seja, não existe uma cultura preventiva, de tratar o indivíduo antes que a doença se manifeste, mas apenas de atuação dos serviços de saúde após a instalação destas. Como diz o Médico Pedro Shestatsky [3], não é à toa, portanto, que o sistema de saúde que conhecemos, fundamentado principalmente no tratamento de doenças (em vez de prevenção delas), tem se mostrado um mau negócio nos últimos anos, tanto do ponto de vista humanitário quanto do financeiro”.

As questões aqui trazidas me parecem de interesse vital e é, pois, necessário que a sociedade se mobilize para cobrar dos gestores públicos maior fiscalização e regras para limitar abusos dos empregadores em relação às jornadas de trabalho exigidas dos seus empregados, aliada a condições adequadas de segurança, assim como políticas públicas que visem a uma atuação preventiva na promoção da saúde, como implantar em postos de atendimento equipes multidisciplinares, incluindo profissionais de educação física, nutricionistas, fisioterapeutas e até mesmo terapias alternativas.

Dayana Pessota Leite é advogada na área do Direito Trabalhista

Referências:

[1] https://news.un.org/pt/story/2021/05/1750822

[2] Síndrome do esgotamento profissional

[3] Schestatsky, Pedro, Medicina do Amanhã, Editora Gente, 2ª edição, pág. 26